Há 53 dias, o Governo Federal trabalha para substituir as 8.517 vagas deixadas por médicos cubanos após Cuba decidir encerrar a cooperação do Mais Médicos com o Brasil por não aceitar as novas condições exigidas por Jair Bolsonaro. Delas, ao menos 1.462 vagas seguem ociosas, segundo balanço preliminar do Ministério da Saúde. O número representa 17% das vagas totais, mas não retrata o déficit real de médicos nos municípios brasileiros, já que muitos profissionais que já atuavam na atenção básica pediram demissão e migraram para o programa, deixando as vagas pagas pelas prefeituras. Além de enfrentar um buraco na assistência difícil de medir nacionalmente (não há dados oficiais centralizados dessa migração de médicos), secretários de Saúde temem agora a interrupção da transferência de recursos federais que ajudam a custear as equipes.
Além de remunerar diretamente os médicos que integram o Mais Médicos, a União repassa recursos de até R$ 4 mil reais como ajuda de custo para financiar os demais profissionais por equipe da Estratégia Saúde da Família. A portaria nº 703, de 2011, estabelece o prazo de até 60 dias para substituir vagas que fiquem ociosas. Caso contrário, prevê a paralisação no repasse desses recursos. “É com essa verba que a gente garante o custeio das equipes. O município não tem a menor condição de financiar sozinho”, explica o presidente do Conselho de Secretários Municipais (Cosems) do Amazonas, Januário Carneiro.
Carneiro é secretário de saúde de Tapauá, um município a 565 quilômetros de Manaus que não conseguiu atrair nenhum médico para as quatro vagas deixadas pelos cubanos até agora. Para garantir a assistência aos 18.000 habitantes da cidade, Januário conta que tem feito um rodízio com os outros três médicos remunerados pelo município. Sem os cubanos, são eles os responsáveis pelas sete equipes da Estratégia Saúde da Família. “Com a distância dos grandes centros e os problemas com os serviços de telefonia móvel e Internet, os municípios do interior do Amazonas têm uma dificuldade gigantesca em conseguir contratar médicos”, explica.
No Estado, cerca de 217 equipes de saúde da família alocadas em 46 municípios e sete Distritos Sanitários Especiais Indígenas correm o risco de ficar sem os recursos federais, um impacto que segundo o Cosems chega a 868.000 reais mensais. Lá, 70% das vagas abertas pelo fim da cooperação cubana seguem ociosas justamente no período de cheia, quando se proliferam as doenças transmitidas pela água e tratadas na atenção primária, como diarreia, dengue e leishmaniose.
Até agora, o Ministério da Saúde ofereceu as vagas deixadas pelos cubanos apenas para médicos graduados no Brasil. O programa é alvo de críticas desde que foi instituído por contratar profissionais estrangeiros sem o Revalida, exame aplicado pelo Conselho Federal de Medicina. Para estimular a apresentação dos brasileiros nos municípios, o ministério chegou a fazer uma força-tarefa para contatar os profissionais por e-mail e telefone, estimulando para que se apresentassem nos municípios. Ainda assim, as vagas não foram totalmente preenchidas, mesmo com um número de inscrição recorde. O grande desafio do Governo federal segue sendo garantir a presença desses profissionais nas cidades mais vulneráveis, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.
Médico cubano atende pacientes em Sena Madureira, no Acre Arquivo pessoal Secretaria de Saúde
Ministério estuda prorrogar prazo
O problema da desassistência se soma a esta possibilidade de perda de recursos por municípios, especialmente em um cenário de crise econômica. Já existe uma minuta de portaria para estender o prazo de 60 dias para 12 meses, diante das dificuldades para preencher as vagas do Mais Médicos. O Ministério da Saúde diz que o documento está em análise “para ajustar a recomendação às normativas e legislação vigente”. No entanto, sem a publicação oficial da portaria, não há garantias de que essas verbas serão garantidas no mês de fevereiro.
“A gente não tem condições nem de gritar. Votei no Bolsonaro, mas se soubesse que ia ter um problema desse, não teria feito”, diz o presidente do Comems do Acre, Daniel Herculano Filho. No Estado, contabiliza, metade das vagas deixadas pelos cubanos seguem ociosas. Secretário de Saúde de Sena Madureira, uma cidade localizada a cerca de 150 quilômetros da capital Rio Branco, ele diz que as três vagas deixadas pelos cubanos no seu município foram preenchidas, mas um dos médicos que assumiu já anunciou a possibilidade de desistência e comunicará a decisão na segunda-feira (14). Com informações do El País.
Nenhum comentário:
Postar um comentário