A procuradora-geral da República, Raquel Dodge , pediu ao
Supremo Tribunal Federal (STF) que suspenda todas as decisões judiciais
que permitiram a escritórios de advocacia receberem, a título de
honorários, recursos destinados originalmente à educação básica . Esses
escritórios passaram a representar municípios em pedidos para destravar a
liberação do dinheiro, equivalente a uma diferença que a União deixou
de repassar ao antigo Fundef, hoje Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
da Educação Básica (Fundeb).
Como honorários, essas bancas recebem entre 20% e 30% do
valor devido aos municípios. O dinheiro deve ser usado exclusivamente em
educação básica, e não para custear honorários, na visão de Dodge.
O pedido para suspensão das decisões judiciais que
autorizaram o pagamento de honorários com dinheiro da educação foi
encaminhado pela procuradora-geral ao presidente do STF, Dias Toffoli,
na última quinta-feira. A petição não especifica quantas decisões em
todo o país autorizaram os escritórios a receber honorários a partir de
uma fatia desse dinheiro do antigo Fundef.
Os montantes envolvidos são bilionários. Ao todo, 3,8 mil
municípios, em 19 estados, têm direito a receber R$ 90 bilhões, quantia
referente à diferença que a União deixou de repassar ao antigo Fundef. O
Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação na Justiça para
garantir os repasses, e a decisão judicial favorável transitou em
julgado, ou seja, não cabem mais recursos contra a decisão. Desde então,
teve início a ofensiva de escritórios de advocacia para representar os
municípios interessados em receber os precatórios gerados.
Em agosto deste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) já
havia detectado que, até aquele mês, R$ 8,5 bilhões haviam sido
efetivamente depositados nas contas de 329 municípios de 12 estados. Uma
ampla auditoria teve início naquele momento para verificar se parte
desse dinheiro – entre R$ 1,7 bilhão e R$ 2,5 bilhões – havia sido
depositada na conta de escritórios de advocacia. Um julgamento no
plenário do TCU em 2017 considerou ilegal e inconstitucional o pagamento
de honorários com dinheiro da educação básica
A mais recente decisão colegiada de um tribunal superior
sobre o assunto é de outubro, quando a Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o dinheiro equivalente à
diferença do Fundef não pode custear honorários advocatícios. Os
recursos têm natureza constitucional e devem ser usados exclusivamente
em educação básica, conforme a decisão do STJ.
A ofensiva de escritórios de advocacia para representar as
prefeituras e assegurar os repasses do Fundeb – convertidos em
precatórios – se dá principalmente na região Nordeste, como revelaram
reportagens publicadas pelo Jornal O Globo. Os honorários cobrados são
da ordem de 20% do total do dinheiro a ser depositado, o que significa
que os escritórios tentam abocanhar um montante que pode chegar a R$ 18
bilhões.
Em agosto de 2017, o TCU já havia detectado que um único
escritório arregimentou mais de cem prefeituras no Maranhão e poderia
faturar R$ 1,4 bilhão. Um acórdão na ocasião proibiu as contratações.
“Decisões judiciais autorizando o destaque de honorários
advocatícios contratuais nos precatórios causam risco de grave lesão à
ordem e à economia públicas, porquanto permitem que verbas estritamente
vinculadas aos gastos em educação sejam aplicadas em finalidade diversa
daquela prevista na Constituição Federal”, argumentou Dodge no pedido
encaminhado ao STF na última quinta. “A gravidade e urgência da
situação, que compreende a possibilidade de desvio de finalidade na
aplicação de verba bilionária destinada à educação, exige e justifica a
intervenção dessa Suprema Corte”.
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